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Destaques

Lua

Hécate, deusa grega das encruzilhadas, por Stéphane Mallarmé, 1880. Ah, Hécate, no desvelar da lua A noite obscura encobre o sombrio segredo Do poder oculto e fugidio do aparecer  Na noite eterna que encobre em mistério Soturna e lúgubre a verdade esquecida Entre memórias há muito perdidas e apodrecidas Do que se tem como a luz que emana de ti  Vendo agora, no clarão sombrio  Da noite que engole o Ser e o Mundo  E seu Abismo de negrume e Nada Somos tragados adentro da magia da deusa Hécate, nos abençoe e fortaleça Seu glóbulo ocular entre-nuvens  Disperso porém presente, vívido porém evanescente Somos reféns de ti nas noites de glória Ao grande Sabá cósmico à Máquina Tanatoerótica  De Nosso Senhor Dioniso, expressão viva Da tripartite de seu do rito profano  Deus coroado das terras da Frígia  Gerado, destroçado e germinado  Para ascender do Abismo da destruição  Delirante de alegria orgástica em seu ato de Sacrifício   E pela máxima diabólica da transgressão Lhe solicitamos a benção, ó

O homem e o outro

A Criação de Adão de Michelangelo, 1511.

Somos constantemente tomados pelo espírito de algum deus desconhecido. Seja pelo da embriaguez, da exaltação, da melancolia, da introspecção, da crueldade, da malevolência etc. todos os espíritos exprimem ideias que o homem anteriormente pensou em seu complexo arranjo de conceitos de significações do mundo. O sujeito homem não consegue fugir de suas manifestações maniqueístas e estruturalistas da essência das coisas. O “que?” desconhecido lhe escapa sempre pelos dedos ensaboados da racionalidade, como se fosse intrinsecamente necessário perguntar a questão fundamental da filosofia “o que é?”. No fundo, não há, para o homem, como para qualquer coisa, saber algum aguardando no quarto escuro dos mistérios. Somente algo mais escuro, mais desconhecido e sem sentido a ser novamente definido como sem fundamento.

Todos os espíritos, sejam anjos ou demônios criados pelo homem, são ideias. Mas não devemos negligenciar tais ideias. Elas são poderosas, extremamente poderosas a ponto de afetar o psicológico humano. Uma entidade – se devemos denominar de tal modo – ativa instintos desconhecidos do ser humano a ponto de, pelo demoníaco ou do divino, operar transmutações nos seus atos. É o círculo vicioso do medo que volta sua face sempre para o fustigar no saber e no não-saber: ele é o movimento de devir próprio da intimidade com a imanência mística. Consiste no movimento centrípeto de conjunção de existência de um mundo outro do que o visível, um fazer tornar fenomênico uma realidade – mesmo que eludida pela racionalidade estrita – numênica e oculta. Um modo de existência obscura que só se desvela nas  noites escuras do pensamento, nas embriaguezes da loucura ou do sonho o qual transmite sua (in)sanidade de forma comunicativa ao sujeito consciente, um dionisismo selvagem de brutalidade animalizante aquém da lógica iluminada de um estado de consciência psicologicamente sóbria.

Aturdimentos de profunda gnose cujo ascetismo não se diz de um aquém ou para além, mas tão somente um aqui e agora mais profundo e contundente. Como se os diversos deuses, anjos e demônios que se ocultam sob este véu de Maya não estivessem tão distantes, mas cuja proximidade não se distinguisse da bactéria que caminha sob nossa pele e nos é de conhecimento tão natural. Todo um mundo subentendido e enuviado desfocado pelas lentes grossas de nossa percepção, mas que existe em sua realidade final, afetando, atuando, mais do que no mundo como “coisa”, mas como Ideia, funcionando e agindo enquanto poder de afetar o elemento da vontade e desejo do animal homem. Este ainda tão supersticioso e - por que não? - criativo, animal.


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