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Destaques

Lua

Hécate, deusa grega das encruzilhadas, por Stéphane Mallarmé, 1880. Ah, Hécate, no desvelar da lua A noite obscura encobre o sombrio segredo Do poder oculto e fugidio do aparecer  Na noite eterna que encobre em mistério Soturna e lúgubre a verdade esquecida Entre memórias há muito perdidas e apodrecidas Do que se tem como a luz que emana de ti  Vendo agora, no clarão sombrio  Da noite que engole o Ser e o Mundo  E seu Abismo de negrume e Nada Somos tragados adentro da magia da deusa Hécate, nos abençoe e fortaleça Seu glóbulo ocular entre-nuvens  Disperso porém presente, vívido porém evanescente Somos reféns de ti nas noites de glória Ao grande Sabá cósmico à Máquina Tanatoerótica  De Nosso Senhor Dioniso, expressão viva Da tripartite de seu do rito profano  Deus coroado das terras da Frígia  Gerado, destroçado e germinado  Para ascender do Abismo da destruição  Delirante de alegria orgástica em seu ato de Sacrifício   E pela máxima diabólica da transgressão Lhe solicitamos a benção, ó

Alegria e Sofrimento


 Roda da Fortuna, Tarô de Marselha 

O paradoxo das redes sociais é que todos só desejam mostrar para o outro seu lado positivo, suas conquistas, vitórias, prazeres, virtudes e alegrias. Por outro lado, o sofrimento diário, o sofrimento que sempre nos acompanha e que nos é mais conhecido do que qualquer uma dessas coisas que fingimos possuir todos os dias e com as quais mascaramos nossas vidas nas belas fotos e vídeos a serem aclamados por nossos amigos e chegados virtuais nada são mais do que uma forma de fuga, de eludir constantemente das consequências das contingências cotidianas que a todos afetam de forma igual com uma certa justiça democrática. 

Como sempre se ouve por aí “todo mundo tem seus BO”, mas é a covardia e a vergonha que impede o individuo de ter uma espécie de solidariedade frente ao sofrimento, pois tudo o que importa, tudo o que sempre importa, é a imagem de sujeito impecável, infalível e bem apessoado, bem constituído e alegre na sociedade de produção que tem como princípio final uma espécie doentia de alegria. Não a alegria que se vangloria do sofrimento, se desfaz e renasce dele, mas aquela alegria do fingimento, que simplesmente considera o sofrimento como uma ficção.

A sociedade dos últimos homens prevista por Nietzsche onde, como ele afirma em seu Zaratustra com estes dizendo “nós, os últimos homens, inventamos a felicidade”. É o tipo de sociedade que nega o sofrimento na vida, foge, esconde, como se ele não existisse e não significasse nada, só importa a alegria, a alegria pela alegria. Não a alegria que se conquista pelo esforço - a alegria paga com sangue e espírito. Dessa alegria de mercado nada me interessa, essa alegria que você compra com dinheiro e se satisfaz com o produto genérico e artificial de uma troca. 

“Eu te dou aqui um registro fotográfico da minha alegria e você me devolve um símbolo de coração representando sua aprovação da minha alegria eternizada no instante de um frame”. Alegria ingênua, vazia, desfigurada e ausente de si mesma. A alegria é amarga, pois ela é um caminho, um sentimento que se desperta por uma conjunção de elementos e muitos deles passam necessariamente por um aspecto de desprazer como propulsores para que o prazer funcional da alegria ecloda. Não há alegria instantânea, não há modo de eternizar a alegria, não como comprar alegria.

A alegria vem dos mais infinitesimais estímulos, sejam no presente sejam na memória, mas sempre por uma leve ou profunda melancolia que a acompanha em seu encalço, como que por seu pontapé inicial ou por seu findar. Não há alegria sem sofrimento, e não há sofrimento sem alegria, como uma verdadeira roda da fortuna que gira sem parar e que entrega seus frutos de prazer e gozo orgulhosamente após passarem por todo martírio e desgosto da vida, assim como após todo esse desenlace de colheitas frutíferas e abundantes vem, a certo momento, colher seu preço com a escassez e os temporais. O ponto fundamental é: não virar a cara para esse destino e glorificar a vida, expor suas marcas na Terra, seja na primavera ou no inverno.

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