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Destaques

Lua

Hécate, deusa grega das encruzilhadas, por Stéphane Mallarmé, 1880. Ah, Hécate, no desvelar da lua A noite obscura encobre o sombrio segredo Do poder oculto e fugidio do aparecer  Na noite eterna que encobre em mistério Soturna e lúgubre a verdade esquecida Entre memórias há muito perdidas e apodrecidas Do que se tem como a luz que emana de ti  Vendo agora, no clarão sombrio  Da noite que engole o Ser e o Mundo  E seu Abismo de negrume e Nada Somos tragados adentro da magia da deusa Hécate, nos abençoe e fortaleça Seu glóbulo ocular entre-nuvens  Disperso porém presente, vívido porém evanescente Somos reféns de ti nas noites de glória Ao grande Sabá cósmico à Máquina Tanatoerótica  De Nosso Senhor Dioniso, expressão viva Da tripartite de seu do rito profano  Deus coroado das terras da Frígia  Gerado, destroçado e germinado  Para ascender do Abismo da destruição  Delirante de alegria orgástica em seu ato de Sacrifício   E pela máxima diabólica da transgressão Lhe solicitamos a benção, ó

Sobre pessoas


 Falcões da Noite de Edgar Hopper, 1942.  

Começa sempre assim, um pequeno incômodo, uma coceirinha no topo do crânio, um cheiro de odor podre ao redor, mas não tão forte, ainda dá pra se conviver. Esse incomodo cresce e você olha ao redor com menos prazer, com menos deslumbramento, você não enxerga mais nos outros qualidades escondidas, não se tem onde mais entrar, a porta foi aberta e a sala é muito estreita, coloca-se o pé dentro da água e ela não bate nem no joelho. O que se passa a seguir é uma claustrofobia, você não consegue conviver com ambientes fechados, mentes pequenas, espíritos rasos, vidas finas, no sentido estreito. E existe algo mais, um cheiro pungente que cresce cada vez mais, um odor de coisa morta. Passam em frente ao espelho como vampiros sem reflexo, apenas cadáveres ambulantes, movidos por cordas como fantoches. É tudo morno demais, nem ferve nem gela, tudo insosso, tem uma luz de fundo incômoda, nem forte a ponto de cegar, nem escuridão onde se possa mergulhar. 

Andam todos sempre em grupo, percebeu? Característica marcante de tal animal. Bandos que se interligam, em rituais sempre cheios de pirotecnias e excesso de barulho. Nada melhor do que se afastar, respirar a fresca brisa que vem de locais abertos. Ah, mas também é bom encontrar locais abertos nos outros, além da solidão. Abrir seus baús de tesouro e procurar incessantemente por algo, mas nunca encontrar. Que tipo de prazer estranho, o de não encontrar o que se procura. Como se você mergulhasse e procurasse o fundo, mas nunca o alcançasse. É assustador, ao mesmo tempo em que é libertador. Claro que existem perigos, quanto mais fundo, mais frio e escuro, mas as descobertas, quanto mais dentro do abismo, mais brilhantes são, como um belíssimo, e ao mesmo tempo aterrorizante, peixe-diabo. 

Falta ar para tal mergulho, falta oxigênio, nem mesmo o próprio mar seria capaz de se explorar, de tão diverso, insondável e povoado que ele é. Navegar em mares assim é de uma alegria incrível, mais ainda quando os mares se encontram e se perdem, se deslocam em tormentas e calmarias, misturam ecossistemas e histórias. O mais inusitado e fascinante disso é que as vezes você encontra mares profundos onde julgava ter visto apenas um charco raso. E põe seu barco a velejar, buscando as ilhas desertas do oceano, os oásis do deserto a ser explorado, pois conhecer é mais ou menos isso: mergulhar, procurar, explorar... se perder, e talvez nunca se encontrar.

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