Pular para o conteúdo principal

Destaques

Lua

Hécate, deusa grega das encruzilhadas, por Stéphane Mallarmé, 1880. Ah, Hécate, no desvelar da lua A noite obscura encobre o sombrio segredo Do poder oculto e fugidio do aparecer  Na noite eterna que encobre em mistério Soturna e lúgubre a verdade esquecida Entre memórias há muito perdidas e apodrecidas Do que se tem como a luz que emana de ti  Vendo agora, no clarão sombrio  Da noite que engole o Ser e o Mundo  E seu Abismo de negrume e Nada Somos tragados adentro da magia da deusa Hécate, nos abençoe e fortaleça Seu glóbulo ocular entre-nuvens  Disperso porém presente, vívido porém evanescente Somos reféns de ti nas noites de glória Ao grande Sabá cósmico à Máquina Tanatoerótica  De Nosso Senhor Dioniso, expressão viva Da tripartite de seu do rito profano  Deus coroado das terras da Frígia  Gerado, destroçado e germinado  Para ascender do Abismo da destruição  Delirante de alegria orgástica em seu ato de Sacrifício   E pela máxima diabólica da transgressão Lhe solicitamos a benção, ó

Um Estranho Sob Minha Pele

 


O Pesadelo de Johann Heinrich Füssli, 1781.

Insatisfação constante. Com o que se pensa, se faz, se sente. Nada é suficiente mais, mas não a ponto de querer cessar de fazer, mas sim como se houvesse uma pedra no sapato, um corvo preto no seu ombro ou uma força que te puxa pra baixo no mar se afogando. O desejo de continuar está ali, mais forte do que nunca, mais ardente do que nunca, ainda assim esse cheiro de carne estragada na sua vida impregna suas narinas. Insosso, falta tesão em você onde ali havia tanta garra e tara pela vida, tanta força de buscar, se precipitar nos cumes mais vertiginosos. 

E nem é aquela fraqueza típica, a desolação de um “querer findar com tudo”, é o meio termo morno que mais assusta: cômodo, chato, entediante. Falta o amargor da morte que se insinua na mente e o apimentado do desejo ardente de vida que almeja mais, mesmo que necessite te matar um pouco pra isso. Todo a mais valia de poder fica reclusa aqui, nesse processo de escrita penitente e auto confessional - mais que isso - terapêutico, pois nem psicólogo, padre ou mesmo amigo tem a conscienciosidade de um bom ouvinte como o papel em branco.

Caso psiquiátrico ou mesmo religioso, não quero ser julgado, por isso não falo o que penso para os juízes dessas instituições, somente para a folha, e da folha que ela - como júri neutro - dê seu veredicto. Falta fogo e falta gelo, falta substância que queima a pele lisa. Humor irritadiço que não se comove, só é como uma superfície de vidro extremamente polida e quebradiça, um espelho que você se vê idêntico a si mesmo, mas não se reconhece, só um vulto, um fantasma do que era, um duplo desorganizado da sua imagem que não mais é o que você sempre sentiu de si, só uma sombra. Um quadro rasgado, com fiapos chamuscados por um incêndio de anos atrás e que não tem mais brasa suficiente nesse fogo pra terminar de consumir essa imagem distorcida e poder dar espaço pra se pintar outra, só deixar ali em exibição esse espectro de si. Não morre nem nasce, um feto abortado no ventre. Um resto de gente que não encontra nem em si nem no outro mais lugar. 

Quando que cessa esse estranhamento, esse desconhecimento de si consigo mesmo? Só uma pira sacrificial pra reduzir meu próprio espírito a cinzas e redimir totalmente o sentimento de um outro sob minha pele, um estranho que não sou eu.

Comentários

Postagens mais visitadas