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O Som do Vazio
Quando assustado estou, encurralado em meus problemas e aflições
Olho para o céu como uma criança ansiosa
pelo seio da mãe
Oro pedindo paz, tranquilidade e amor
Acima de tudo, peço para o papai do céu
uma só coisa: retire de mim todo o medo
Mas escuto vindo lá de cima um som
estranho, sinistro que vem como uma trapaça
Um grande entoar pelos acordes de instrumentos
musicais engenhosamente projetados
De um algo que não somente não cessa meu medo
Mas o projeta, como uma lupa, rumo ao
infinito
Não sei que melodia estranha essa música
do vazio se aparenta
Só sei de uma coisa: nenhum medo de coisas
comuns sequer chega perto
A morte tem, de certo modo, um tom
próximo, mas o grave desse som é mais profundo
O frio da angústia é agudo em comparação,
mas não segue o mesmo ritmo
Nesse entoar de sinos infinitos como o
mais cósmico
requiem
aeternam
Com o
tenebroso ‘quê’ de cemitério que as estrelas exalam
O
vazio lá de cima me responde
Com
suas luzes emanadas como o fogo de um crematório
E os astros
mortos brilhando como os fogos fátuos
Exalados
pelos caixões de defuntos em processo de decomposição
E o
medo, mais que nunca, se apossa de mim
Pois o
que percebo dessas estrelas é seu caráter fantasmagórico
De velhos carniçais e zumbis reanimados fitando-me
atentamente lá de cima
Meu olhar fixo para as estrelas me estremece
Não consigo, de maneira alguma desviar a visão
De um universo todo feito de velhos cadáveres a todo instante
me vigiando
Mas como a criança dos contos de fadas
Que como que por uma obrigação das lendas tem de aprender
Me vejo impelido ao caminho de volta ao lar
E deste mausoléu de velhas almas decrépitas me despeço a
visão
Tornando uma vez mais a boca sedenta para o seio da mãe cheio
de leite
E como que por um milagre, estou nele, sempre estive nele, nunca
saí dele...
Somente implorei, como um ancião já bem mal da cabeça passa a
fazer
Por astros e planetas quando tudo o que dependia sua
felicidade e colheita
Já encontrava sob seus pés, próximo de si e circundante a si...
Na noite, um glóbulo branco de sangue pulsante nos ilumina
fielmente
Durante o dia, uma esfera de fogo dadivosa
E de infinita generosidade nos concede sua benção
Aqui embaixo, o tormento e a angústia, o medo e o terror
São findados quando eu percebo que minha insignificante carne
É produto desse astro ainda vivo, e deixo de me preocupar com
o matadouro
De deuses acima da minha cabeça
Pois como as velhas leitoras de mãos sempre dizem:
As constelações nada mais são do que deuses de outrora
Mas pouco me importa um tempo encerrado
Ou mesmo nebulosas como berçários de divindades que nunca meu
povo chegará as ver
Somente essa Terra, com todo sangue derramado
Todo incesto, estupro, genocídio, escravidão...
Terra maldita com tanta capacidade de ser bela
Que nada deve aos deuses lá de fora
Que pode ser divina por si mesma
Inteira, completa, eterna – mesmo que finde
E ainda que eu ame essa Terra de controvérsia e contradição
Um frio na barriga me dá toda vez que levanto meus olhos para
o céu
Pois sei que o homem não será nunca capaz de satisfazer-se
Com o que o infinito maior do que a própria Terra lhe deu
E ansiar por deuses há muito mortos tem de oferecer
E quem sabe o que os criadores desses deuses serão capazes
Quando nós os encontrarmos?
Ou mesmo, o que será que nós iremos encontrar, quando o
limiar último
Nós cruzarmos e descobrirmos de onde vem
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